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sexta-feira, 9 de abril de 2021

Religião ou Espiritualidade?

Em tempos difíceis como os que passamos por causa da pandemia de Covid-19, o sentimento religioso é um importante componente na vida de milhões. Nestas horas de incerteza e medo, a busca por algo sólido, no qual as pessoas sempre confiaram, é extremamente significativo. Porém, com o fechamento dos templos, muitos cristãos parecem perdidos em meio a esta balbúrdia. E os cristãos, no entanto, deveriam ter a consciência de que Cristianismo é muito mais do que simplesmente frequentar a igreja no domingo.

Como professor de Literatura e Redação, estou passando pela experiência da Educação a Distância de modo compulsório. E cheguei à conclusão de que um aluno presencial pode não estar realmente presente: o corpo está em sala de aula e a cabeça nas nuvens. Da mesma forma, uma espiritualidade cristã sadia não depende necessariamente de cultos ou missas presenciais. E isso vem comprovar que o Cristianismo, apesar de sua dimensão comunitária, é, principalmente, a religião do coração.

E mais que isso, Cristianismo é espiritualidade. A institucionalização do Cristianismo por Constantino, no Concílio de Niceia, em 325, teve aspectos positivos: deu à comunidade cristã um sendo de unidade, mas ao mesmo tempo afastou o Cristianismo de sua simplicidade, valorizando acentuadamente a noção de Igreja-monumento (institucional) e ofuscando a chama da Igreja-movimento.

Nesta hora tão ruim para a humanidade inteira, cabe aos cristãos redescobrirem o senso de espiritualidade maior do que da religião. Uma religião é o conjunto de três elementos característicos: uma hierarquia organizada, uma doutrina definida e uma liturgia estabelecida. Estes elementos fazem com que se reconheça a prática de determinada religião, mas, no caso do Cristianismo, não são necessariamente aplicados. 



 Lembro-me aqui de uma veste tradicional dos bispos anglicanos, a Chamarra. A Chamarra é um colete (opa) vermelho ou preto, talar e sem mangas, aberto na frente, usado sobre o Roquete. A Chamarra era, originalmente, uma jaqueta de equitação ao ar livre e suas pregas traseiras facilitavam o montar e desmontar do cavalo. Ela simboliza o papel do Bispo como apóstolo, missionário, aquele que vive em movimento, viajando, pregando ao mundo as boas novas de salvação de Jesus Cristo. Ela relembra o fato de que o bispo não é alguém que deva ficar preso numa Catedral ou num escritório diocesano, mas um missionário que não tem onde reclinar a cabeça como o seu Mestre, Jesus de Nazaré. Ele não tem um lugar definido, fixo, mas é o que espalha as boas novas e cuida de seu rebanho disperso como o Bom Pastor que busca a ovelha perdida.

 

 A Chamarra é o símbolo do clérigo nesta pandemia. Figura importante na pregação da Palavra e na Administração dos Sacramentos, ele cuida de um rebanho disperso e usa ferramentas modernas, como a internet, para desenvolver seu trabalho tão antigo. Aqui não é mera hierarquia eclesiástica, mas função e serviço ao Povo de Deus.

Quanto à doutrina, a Bíblia é farta de textos que mostram que o Cristianismo não é uma doutrina, mas uma pessoa: Jesus de Nazaré. Como crentes na ressurreição, acreditamos que Jesus está vivo. Como crentes na Trindade, cremos que ele, como Deus, está em todo lugar, é Onipresente, não confinado a um templo. Como pessoas que confiam nas Escrituras, cremos que ele é o caminho, a verdade e a vida. Afirmamos ainda que ele está conosco até a consumação dos séculos, que ele acalma as tempestades, que é capaz de curar enfermos e até de ressuscitar os mortos! A vida que ele concede ao que crê não pode estar confinada no templo, porque, pelo Espírito Santo que habita em nós, podemos ter comunhão com ele em qualquer lugar e a qualquer momento.

Não estou afirmando que a vida comunitária da Igreja não seja importante e muito significativa. Tenho muita saudade e sinto muita falta de cantar hinos, ouvir os sermões, privar a companhia dos irmãos. Contudo, não precisamos de um templo para adorar a Deus, que deve ser adorado não em um lugar específico, mas em espírito e em verdade, segundo o próprio Jesus. Assim como uma amizade verdadeira subsiste mesmo que amigos fiquem muito tempo sem se encontrarem (já dizia o poeta: “amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração”), nossa fé em Cristo continua existindo mesmo sem que haja reuniões regulares e presenciais no local de culto.

Portanto, a pandemia e o distanciamento social não são impeditivos para vivenciarmos a nossa fé, porque ela é mais que religião: é espiritualidade, é vida em abundância! E espiritualidade existe quando há um coração sincero que busca conexão com o Eterno.

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